Uma pitadinha apenas de ternura

À mesa: pão integral, óleo sem colesterol, margarina livre de gorduras trans, refrigerante diet, suco natural, adoçante, queijo Minas, ricota, leite desnatado, peito de peru ou chester light. Já aboli a bolacha recheada. Salgadinho nem pensar! Carne gorda é uma afronta. Café com açúcar é um crime. Feijoada, apenas a metade do que normalmente comeria. Pele de frango é morte certa. Salada só com óleo de oliva. Tudo faz mal, tudo produz colesterol ruim, tudo engorda.

O quê vai ser de nós? Cadê o sabor das nossas vidas? Quem sabe? Quem sabe se eu parar de me estressar no trânsito, no trabalho, na fila do supermercado, no banco, com aquele idiota que trancou o cruzamento, com o espertinho que furou a fila, o outro que estacionou na minha vaga enquanto eu dava sinal e esperava a minha vez, com o político corrupto, com o ladrão que pode me atacar na entrada de casa, com assalto, seqüestro relâmpago, arrastão, bala perdida, o efeito estufa, a falta de água e os Estados Unidos produzindo um quarto da emissão de gases poluentes do mundo, eu viveria menos estressada?

Com certeza o açúcar e margarina fazem bem menos mal que tudo isso. Na minha infância, havia um desenho animado em que um cientista atrapalhado criava um monstro em laboratório e, na abertura do programa, aparecia colocando em um caldeirão vários produtos químicos que resultariam em "Milton, o Monstro", cujo coração era de manteiga. Enquanto fazia isso, o cientista narrava todos os passos: ‘uma pitadinha apenas de ternura, é coisa que mal não faz’, acabando por derramar ternura demais no caldeirão. Sugiro que todos nós adicionemos às nossas vidas uma pitadinha apenas de ternura...

Comentários

eu disse…
Quem disse que não se encontra receitas boas na internet.
Lívia Vieira disse…
Queridíssima, teus textos sempre nos fazem pensar um pouco mais sobre o que acontece a nossa volta...
Inspiração!
Adoro essa mulher... simples assim.
Beijo grande amiga!